29 setembro 2009

HISTORINHAS DO VIOLÃO – PARTE II

Nikula, Silvio Vinhal e Celsinho - Ituiutaba, 1981
Por volta de 1980 eu estava fazendo um tratamento regular para um desvio da coluna, em Goiânia (que acabou sendo resolvido cirurgicamente em 81). Numa dessas andanças pelo centro de Goiânia, de um hospital a outro, passei diante de uma loja de instrumentos musicais e fiquei boquiaberto diante de tanta novidade. Acho que foi a primeira vez na vida que me deparei com uma loja de instrumentos como aquela, com tanta variedade e cada instrumento mais lindo que o outro. Coisa de encher os meus olhos adolescentes, pouco conhecedores do mundo.

Na vitrine, capturando meu olhar de forma inequívoca, estava um violão Di Giorgio de 12 cordas, em aço, com detalhes brancos no corpo do violão (aquela proteção embaixo das cordas para proteger o tampo). Eu fiquei ali estático, meio que fisgado pelo violão, e minha mãe, que me acompanhava, sentiu-se tocada pelo meu desejo – talvez até para me aliviar um pouco aqueles dias tão penosos, em que estávamos descobrindo um problema sério na minha coluna e que ia exigir alguns anos de um tratamento chato e do qual ainda não tínhamos idéia de onde ia dar.

O fato é que o violão era a “réplica” mais próxima do violão do Celsinho, o meu amigo líder da comunidade de jovens, que tinha sido meu ex-professor de religião no Colégio Estadual Central (hoje Israel Pinheiro). Ele tinha um violão de aço de 6 cordas, com os detalhes pretos, que tinha um som maravilhoso. O Celsinho era um ídolo pra mim, acho que só comparável ao que a Xuxa significou para muitos “baixinhos” de gerações seguintes. E ele era meu ídolo por uma razão muito simples. Era o contato mais próximo que eu tinha com uma boa aparelhagem de som e boa música, que eu podia ouvir na casa dele. Mas, ele próprio, cantor na noite e cantor na igreja, ocupava um lugar que na época, eu também queria ocupar. E além de tudo era meu amigo, era acessível, e com certeza era meu inspirador. Aquele violão, na vitrine de Goiânia, representava um meio de chegar um pouquinho mais próximo desse sonho, de ser “pelo menos” igual a ele.

Não sei como minha mãe fez aquela compra. Com certeza dividiu em mil prestações, e passou apuro para pagar, mas eu saí de lá com aquele violão imenso debaixo do braço.


Deise, Celsinho, Nikula e Silvio Vinhal - O Grupo ASAS
Em janeiro de 1981 eu operei a coluna e saí do hospital com um colete de gesso que eu teria de usar por pelo menos um ano. Fiquei em recuperação nos primeiros meses, atrasei minha entrada na escola e penei o ano todo para recuperar minhas notas. Pela primeira vez na vida eu fiquei para recuperação, só em matérias pesadas: Química, Biologia, Física e Matemática, se bem me lembro. Talvez nem tivesse conseguido passar de ano se não tivesse sido pela ajuda providencial da Cristina e da Selma, que foram meus anjos da guarda.

No entanto, apesar de toda essa dificuldade na escola e do colete de gesso que limitava os meus movimentos e me obrigava a usar roupas muito maiores que o meu número, me deixando com uma aparência pra lá de estranha, eu me inscrevi no Festival de Férias da Música Popular de Ituiutaba, com o Grupo ASAS, que eu, Celsinho, Nikula e Deise criamos para o evento.

Foi um festival lindo, com muita gente boa. Aquelas melodias e letras ainda povoam minhas melhores memórias até hoje. Eu já estava feliz por me apresentar, e de certa forma dar uma volta por cima em tudo aquilo de “ruim” e de diferente que estava me acontecendo naquele ano. Já estaria feliz se tivesse ficado entre os classificados, mas fomos os vencedores, com a música Retratos. Lembro-me do pulo imenso que dei quando saiu o resultado, com gesso e tudo, e minha coluna ainda em recuperação. Foi o coroamento de um momento que significou muito em minha vida, e também para aquela amizade.

Silvio Vinhal, Celsinho Vilarinho e os violões "quase" gêmeos

28 setembro 2009

TUDO CAMINHA PARA A LUZ

Eu fui criado dentro do Catolicismo, e conservo algumas “tradições” como, por exemplo, meus santos inspiradores: São Francisco de Assis, Nossa Senhora Desatadora de Nós e São Jorge.

No entanto, hoje vejo as religiões apenas como pontes que usamos para chegar ao Ser Superior que concebeu e sustenta o universo do qual somos apenas uma ínfima parte. Ateu não poderia ser, pois se não criei o universo em que vivo, chamo a quem o criou de Deus. Outros poderão chamar de Física, Acaso, ou o que quiserem.

Acho a religião importante para criar no indivíduo a idéia básica do amor ao próximo, princípio da Ética. Talvez fosse mais difícil ensinar essa importante conquista da humanidade de outra forma. Frases simples como: “Viva e deixe viver”. “Ame ao próximo como a si mesmo”. “Não faça ao outro aquilo que não gostaria que fizessem a você”. São capazes de exprimir e de resumir os dogmas e preceitos de qualquer religião que seja sã. O resto é blá-blá-blá e uma tentativa de impingir medo, culpa e fidelidade (ao dízimo) nos fiéis.

Não creio que Deus necessite de adoração, louvação e orações, embora creia que Ele nos ouve, quando somos sinceros, ou mais do que isso, permite que nossa oração se materialize em milagres cotidianos, de magnitude variável.

Hoje eu creio que orar pode ser um estado permanente, onde uma simples manifestação de nosso desejo, já é a oração em si. Para chegar aqui, entretanto, não se iludam, passei por todos os estágios anteriores. Por isso, recomendo que todos, principalmente as crianças, adolescentes e jovens, sejam iniciados em alguma religião. Religião sã, entendam isso, por favor. Há muita coisa insana por aí disfarçada de religião, a iludir a boa fé das gentes.

A fé é realmente importante, e hoje a física quântica está aí para provar que pode mesmo remover montanhas. Hoje eu acredito e sei que ao homem foi dado o dom de criar tudo aquilo que desejar. É aí que reside sua “imagem e semelhança” com Deus, e pensando contemporaneamente, não poderia ser diferente.

Não acho que a Bíblia que conhecemos é o livro definitivo de Deus. Creio que foi, mas continua sendo escrito, para quem sabe ler, inclusive nas entrelinhas. Gutemberg consolidou aquilo que existia, mas ninguém me garante que parou de ser escrito ali.

Não duvido que Deus seja perfeito, mas acredito que Ele também evolui, porque demonstrou isso na sua criação. Tudo evolui. O Deus em que creio é benevolente, criativo, um pai amoroso que observa os “primeiros” passos de seus filhos, só interferindo quando necessário, mas preferindo não fazê-lo para fortalecer sua criação.

Creio, também, que tudo caminha em direção à Luz, e que tudo tende a se transformar nessa energia essencial, capaz de consumir toda a treva e de recriar infinitamente o universo.

25 setembro 2009

GRAÇAS A DEUS, A LAGOA ESTÁ AÍ

Na minha infância, quase adolescência já, de tanto ouvir as “Piadas do Barnabé” numa vitrolinha lá de casa, criamos uma historinha familiar muito divertida e reconfortante. A piada era mais ou menos a seguinte:

Em uma cidade do interior havia dois amigos muito chegados. Um deles religioso e muito temente a Deus tinha por hábito expressar em voz alta, sempre, antes de fazer ou manifestar qualquer coisa:

_ Se Deus quiser eu vou conseguir fazer tal coisa, se Deus quiser eu supero tal dificuldade...

O outro amigo era bem mais cético, abusado até, e achava muita graça de tudo. Vivia dizendo que o compadre era muito carola, e que Deus devia ter mais o que fazer do que ficar querendo coisas para ele a todo instante. Que deixasse Deus em paz.

O amigo religioso refutava dizendo que sabia história de pessoas que não temiam a Deus e, por castigo, foram transformadas em sapo durante muitos anos, tendo que ficar confinadas numa lagoa que havia ali mesmo na cidade.

O cético prosseguia blasfemando, ignorando os conselhos do amigo devoto, até que Deus de fato se indignou e resolveu transformá-lo em um sapo enorme, verde e rabugento, destinado a penar nos alagados daquela lagoa por um bom tempo.

Depois que se cumpriu finalmente o tal castigo e Deus viu-se vingado, devolveu ao incauto a sua forma de gente. Quando os amigos se reencontraram, no entanto, o devoto percebeu que o blasfemador continuava a fazer afirmações sem manifestar sua fé em Deus e sem colocar suas ações sob a guarda do Altíssimo.

_ Cumpadi, cumpadi... Passe a dizer “Se Deus quiser...” Será possível que ainda não aprendeu a lição?

Ao que o amigo turrão respondia:

_ Olha cumpadi, se Deus quiser eu vou, mas se Ele não quiser, a lagoa ta ai!

Nos tempos do Bairro Ipiranga, de vida humilde e difícil, nos tempos em que minha família era muito pobre – e mal sabia - porque éramos, também, muito pobres em cultura e conhecimento – morávamos perto da Lagoa do Ipiranga, lá em Ituiutaba-MG. A nossa piadinha particular era que, quando estávamos frente a algum desafio - daqueles que dava medo encarar - dizíamos, entre nós, pra nos assegurar que pior do que estava, dificilmente poderia ficar, e que sempre teríamos o apoio da nossa família e nossa casinha pra morar:

_ Se Deus quiser eu vou, se Ele não quiser, a lagoa está aí!

Felizmente, Deus quis. Embora a lagoa, e a nossa velha e pobre casinha, continuem lá.

23 setembro 2009

SEIS RESSALVAS PARA VIVER MELHOR

Por do sol sobre uma represa, no interior da Bahia / foto Silvio Vinhal
Algumas ressalvas que servem pra hoje e servirão para sempre:

1) Lembrar que a vida é aquilo que acontece entre o momento em que estamos e Os nossos objetivos.
O desespero por Conquistar um objetivo não pode e não deve nos impedir de desfrutar em plenitude a nossa vida. Isso não quer dizer, também, que não devamos cuidar do nosso futuro.

2) É cada vez mais importante prestar atenção em tudo que está à nossa volta, principalmente nas pessoas que amamos - nosso bem mais valioso e também o mais perecível.

3) Precisamos cuidar sempre de nossa saúde, alimentação, corpo e dos nossos escolhidos.

4) Devemos aprender a sentir prazer e a sermos felizes com aquilo que TEMOS e não com aquilo que estamos buscando. O amanhã pode não chegar (pra nós) ou para as pessoas que amamos.

5) Viver é uma experiência rica e completa. Mudar o nosso ponto de vista (vendo a nossa vida de outro ângulo - ou nos colocando no lugar de outras pessoas) pode enriquecê-la ainda mais, e nos trazer grandes revelações.

6) Eu desejo para você e para mim, uma vida feliz, plena, rica de valores espirituais e afetivos. (O resto vem por merecimento e acréscimo).


A ALMA DO ARTISTA

Eu fui alfabetizado pela Bibi Ferreira e pela "mão amiga", via televisão, e cresci com as peripécias da brilhante Emília feita pela Dirce Migliaccio, que deu alma à criação de Monteiro Lobato. Hoje o céu está em festa! Emília está se encontrando com o eterno Visconde de Sabugosa (André Valli) e com a Dona Benta (Zilka Salaberry).

















15 setembro 2009

O Brasil não conhece o Brasil!

Chapada Diamantina - BA

Nos últimos dois anos e meio tive a oportunidade de conhecer mais o Brasil. Somos mesmo um país de lindas e diversificadas paisagens, da qual, a maioria, nem conhecemos.

Conhecer o Brasil é fundamental para entender, também, porque somos um país subdesenvolvido. Há muita miséria e muita desigualdade social. Falta, sobretudo, educação ao nosso povo.

Atravessei recentemente o norte de Goiás e o centro da Bahia, e o que vi, além das belas paisagens, foi um cenário desolador, de muita pobreza. Cidades pouco desenvolvidas, pessoas morando em pequenas vilas ao longo da rodovia e quilômetros sem fim de terras sem nenhuma utilização. É claro que são terras que possuem dono, mas que do jeito em que se encontram não se prestam nem à agricultura e nem à pecuária.

Tenho notado que áreas imensas são utilizadas para a criação de gado, mas é uma utilização desproporcional. Pouco gado para muita terra, e o que se vê é que não há nenhum investimento para "melhorar" a terra e as pastagens. O que sobressai é uma mentalidade muito atrasada de aproveitar da terra tudo que ela tem, sem nada investir nela.

Essa prática reproduz o modelo que nos trouxe onde estamos hoje. Concentração de terras e riqueza nas mãos de poucos. Sucateamento do solo, que ao longo das gerações passa a ter uma utilização cada vez menor e pior. Perda da tradição rural, sem que em seu lugar seja criada uma nova tradição, amparada na tecnologia e nos processos mais modernos de criação agropecuária e de agricultura.

Há excessões, nós sabemos, mas infelizmente quase sempre ficam limitadas aos grandes centros e sua área de influência.

O Brasil não conhece o Brasil, e o que se vê é que uma grande parte desse país encontra-se perdida em meio a tantos programas de governo "desacertados" e que parecem gastar mais em publicidade do que no seu objetivo específico.
Espero que saibamos mudar isso algum dia!

02 setembro 2009

ATÉ ONDE IR?

Gosto muito da historinha que usa uma comparação entre a participação da galinha e do porco no café da manhã (ovos mexidos com bacon) para ilustrar a diferença entre “se envolver” e “se comprometer”. Obviamente, a galinha se envolve, pois bota os ovos, e continua a ciscar no quintal. O porco, porém, para dar o bacon tem que estar comprometido, pois tem que dispor da própria carne e da sua vida, por conseqüência.

Nos relacionamentos humanos, principalmente familiares, também precisamos optar por uma dessas posições. Mesmo sem fazer juízo de valor, e sem pensar que uma é melhor do que a outra, há momentos para nos comprometermos e outros em que é vital estarmos apenas “envolvidos”.

Não dá para “morrer’ por quem não está nem aí, por quem faz sempre as escolhas erradas. Aí, no máximo, podemos nos envolver para tentar ajudar, indicar o caminho e dar uma força nas horas mais difíceis.

Para aqueles, entretanto, que estão comprometidos, que dão o melhor de si, e que entendem a contento a importância da reciprocidade e da conseqüência*, talvez valha a pena que também nos comprometamos.

Quando há amor e comprometimento, esse “morrer”, no sentido de dar a vida pelo outro, significa não uma morte verdadeira, mas equipara-se à “morte” da semente, que renasce transfigurada em árvore e perpetua a vida.

Com uma árvore que não dá frutos - a despeito de nossa boa vontade em cuidá-la - às vezes é impossível comprometer-se.

* Reciprocidade e conseqüência, um bom tema para futuras postagens!


01 setembro 2009

COMPAIXÃO, ALGO A SER CULTIVADO

Nesses tempos bicudos, onde fica cada vez mais difícil pensar no “outro”, compaixão tem sido uma palavra em desuso.

Sentir compaixão não é o mesmo que sentir pena.
Aliás, tenho por opinião que pena é um sentimento ruim, que só faz pesar mais o sofrimento de quem julgamos nessa situação. Compaixão, por outro lado, é algo como colocar-se na situação do outro, para ampliar o nosso ponto de vista e baixar nossas defesas. Sobretudo, nos colocarmos no lugar do outro para tratá-lo como gostaríamos de ser tratados, se estivéssemos na mesma situação.

Enfim, ter compaixão é colocar-se ao lado do outro sem julgá-lo. Envolver-se com a situação pela qual ele está passando, reconhecendo que também somos falhos, e que poderíamos estar do outro lado.

Palavra que deveria ser ensinada nas escolas, em aulas de etiqueta e boas maneiras. Sentimento que doutrina o nosso caráter e o nosso coração, na formação para a vida e para a felicidade.

Não se pode ser feliz, realmente, se não percebemos o outro em sua integridade, e se não damos àqueles com quem convivemos, o benefício da retratação, do perdão, da possibilidade de enxergar o próprio erro e corrigi-lo.

Esquecer desse sentimento faz de nós uma sociedade brutal, superficial, egoísta e sórdida. Não por acaso nos defrontamos diariamente com cenas deploráveis na TV e nas ruas, por absoluta falta de compaixão.

Você já sentiu?

* a imagem foi colhida em:
http://stayfreak.blogspot.com/2009_03_01_archive.html