12 fevereiro 2008

Historinhas do Violão - Parte I


Não me lembro direito quando foi que comecei a tocar violão. Lembro-me da minha mãe me levando pela mão ao conservatório para me matricular com o professor Badiinho. Acho que lembro também da gente comprando o primeiro violão, em suaves prestações, lá no “Armarinhos Lord”, em Ituiutaba. O violão, ou o que sobrou dele, existe até hoje, na casa da minha irmã, por uma afetividade boba que permaneceu entranhada naquele violãozinho, Gianinni, que foi tão bom para as minhas primeiras descobertas musicais, com sua madeira meio alaranjada, bonita, o braço fino, que facilitava a empunhadura, e o som afinado e agradável que emitia.

Mesmo antes de aprender os primeiros acordes, eu comecei a compor. Fazia letra e música, e punha a família “de castigo” na sala, para me ouvir. Fico imaginando o que saia daqueles “saraus”, pois até então eu não sabia nada de nada. Até hoje sinto não ter havido alguém, um pouco mais preparado, pra registrar aqueles primeiros passos. Tenho uma curiosidade imensa de saber o que eu os “obrigava” a ouvir. Acho que minha família nunca foi muito musical. Até hoje sou meio traumatizado de tocar e cantar para um grupo que “aparentemente” quer ouvir, mas que presta-se mais a conversar, e acaba não prestando atenção em nada.

Não sou músico de botequim, isso aprendi cedo. Sou músico de palco - onde até hoje pouco me testei - ou de CD, pras pessoas escutarem, de preferência, longe de mim. O meu lado artista gosta de ser ouvido, apreciado, e é assim também que hajo em outras circunstâncias, afinal, para quê falar se ninguém está disposto a escutar. Cantar não é diferente. Não tenho nada contra quem canta nos botecos da vida, muito pelo contrário, tenho por eles a maior admiração, pois sei que é uma tarefa árdua, muitas vezes necessária pra se ganhar o pão de cada dia. Nem sempre, entretanto, é uma atividade prazerosa.

Minha herança musical, é quase certo, veio através da família do meu pai. Ele, muito raramente, vi tocando gaita. Meu avô, talvez mais raramente ainda, vi tocando acordeon. Minha mãe colaborou, pois apesar de achar-se desafinada – o que nem é – sempre gostou de cantar, e já me disse que cantava muito para nós (eu e minha irmã Sandra), quando estava grávida, ou quando éramos pequenos. De minha mãe herdei também o dom de escrever. Acho que ela escreve melhor que eu, embora não dê muito valor a isso. Eu me considero esforçado e persistente. Dessa mistura, por certo, nasceu em mim o compositor.

A primeira música nasceu quase clone de uma modinha do Roberto Carlos, a segunda foi um samba canção para aquela que seria o “esboço” da minha primeira namorada, e esse labor acompanhou-me por toda a vida, até uns três ou quatro anos atrás*. Compuz compulsivamente esses anos todos, e fui acumulando “anéis de vidro em meu baú de ossos”, sem que houvesse, até então, nenhuma projeção maior desse material. Com exceção de algumas participações vitoriosas em festivais, e da gravação dos CDS “GEOgrafia” que esse ano completa 10 anos, de uma faixa no CD do Colégio Nacional, de Uberlândia, e do CD “Cenário”, que fiz em 2001 para homenagear o centenário de minha cidade natal, Ituiutaba. As canções sobreviveram, entretanto. Algumas poucas eu gravei, outras ainda sei de cor, e outras tantas acho que esqueci, pela falta de executar com uma certa freqüência. Acabei desenvolvendo uma memória fabulosa para música, por conta disso, e uma memória meio capenga para outras coisas, por isso, embora não pareça, é um pouco difícil contar “historinhas” como essa. Paciência, ninguém é perfeito! (continua)

* Uma das coisas que anda me intrigando nos últimos anos é justamente o fato de não estar compondo. Ou os meus “guias musicais” me abandonaram, ou então é tempo pra cuidar dessa produção toda, de outra maneira. Vamos ver no que vai dar.

06 fevereiro 2008

Não é Fácil Amar

Imagem de Tiago de Sousa Lopes


É engraçado como ainda nos sentimos sós e distantes das pessoas que amamos, mesmo tendo ao nosso alcance tantos recursos tecnológicos. O mundo se expandiu tanto que levou as pessoas do nosso convívio. Fragmentou as famílias e nos afastou dos amigos de infância, de colégio, de juventude, de faculdade.
Mesmo com tantos recursos à mão, seja através da telefonia ou da internet, às vezes bate uma saudade grande demais, uma vontade de outros tempos, de estar junto daqueles que são importantes em nossas vidas. É melancólico o tema desse blog de hoje. Estou melancólico.

Foram compridos demais esses dias de carnaval. Cansei de não encontrar ninguém conhecido nos milhares de rostos que pupulavam na tela da tv, nas brincadeiras de carnaval pelo Brasil. Não que eu esperasse encontrar alguém conhecido ali, mas justamente pelo anonimato daquela multidão, indiferente para mim, e ao mesmo tempo capaz de provocar esse estranhamento e essa saudade melancólica.

Eu sinto muita saudade de pessoas que passaram pela minha vida, e que desapareceram como que por mágica. Pessoas que não deixaram nenhum rastro, nenhum contato, como se fossem personagens (figurantes) de uma peça de teatro, que saíram de cena de vez depois do primeiro ato, pra ser figurantes em outros papéis, perdendo-se e se reinventando na pequenez e no distanciamento de seus respectivos papéis. Importantes ou não, desapareceram pra sempre na sombra do tempo, na coxia dos anos pelos quais perpassei.

Minha família também está distante, e no mais profundo do meu íntimo eu sofro todos os dias a angústia de saber que talvez nunca mais possamos conviver como já foi um dia, no passado. Agora é preciso que eu me contente com encontros fortuitos, em finais de semana prolongados, natais, anos novos, escassos momentos onde infelizmente nem sempre é possível desfrutar da intimidade de cada um, mesmo que seja por alguns minutos.

Lutamos muito nas batalhas de cada dia. Com sucesso ou fracasso, nos distanciamos das pessoas que amamos. Seria esse o amargo preço que a vida nos cobra? O que é possível fazer então para minimizar esse distanciamento a que nos obrigamos? Vale mesmo a pena?

Só sei que o crescimento nos propõe desafios difíceis, e que, apesar de nos afastarmos do convívio daqueles que amamos, é graças a esses desafios que enfrentamos que passamos a ser por eles admirados e, talvez, ainda mais amados. É preciso recuperar a fórmula do carinho, do afeto. É preciso acender a fogueira que nos reúne, mesmo que esporadicamente, e cuidar para que ela nunca se apague.

Eu tenho medo que as notícias ruins sejam mais rápidas que a minha capacidade de mobilização para ir ao encontro dos meus amados. Acho que essa angústia vai me acompanhar pra sempre, ainda que eu finja não ligar e tente focar meu pensamento – e meu sentimento – em outro lugar.

Tenho medo do desabamento lento e gradual da nossa estrutura humana, frágil, perecível. Queria poder tocar a trombeta do alerta e conter todo o tempo possível, antes que qualquer fatalidade se instale, só pra curtir um pouco mais os abraços, os sorrisos, o carinho e o sentimento todo oculto atrás dos olhares, dos gestos, transmutados em comidas, em doces, em presentes, em telefonemas, e-mails, cartas...

Conter o tempo, pra conter (em mim, em nós) todo o sentimento.
Amar, definitivamente, não é algo fácil.

Melancolia, Edvar Munch, 1891

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Saudade, s. f., Vocábulo considerado sem equivalente noutras línguas e que exprime multiplicidade de sentimentos, sobretudo a melancolia causada pela lembrança do bem do qual se está privado. Pesar, mágoa causada pela ausência de alguém ou de objecto querido. Pesar, desgosto, tristura emanados de alguma recordação alegre ou magoada.