
Na vitrine, capturando meu olhar de forma inequívoca, estava um violão Di Giorgio de 12 cordas, em aço, com detalhes brancos no corpo do violão (aquela proteção embaixo das cordas para proteger o tampo). Eu fiquei ali estático, meio que fisgado pelo violão, e minha mãe, que me acompanhava, sentiu-se tocada pelo meu desejo – talvez até para me aliviar um pouco aqueles dias tão penosos, em que estávamos descobrindo um problema sério na minha coluna e que ia exigir alguns anos de um tratamento chato e do qual ainda não tínhamos idéia de onde ia dar.
O fato é que o violão era a “réplica” mais próxima do violão do Celsinho, o meu amigo líder da comunidade de jovens, que tinha sido meu ex-professor de religião no Colégio Estadual Central (hoje Israel Pinheiro). Ele tinha um violão de aço de 6 cordas, com os detalhes pretos, que tinha um som maravilhoso. O Celsinho era um ídolo pra mim, acho que só comparável ao que a Xuxa significou para muitos “baixinhos” de gerações seguintes. E ele era meu ídolo por uma razão muito simples. Era o contato mais próximo que eu tinha com uma boa aparelhagem de som e boa música, que eu podia ouvir na casa dele. Mas, ele próprio, cantor na noite e cantor na igreja, ocupava um lugar que na época, eu também queria ocupar. E além de tudo era meu amigo, era acessível, e com certeza era meu inspirador. Aquele violão, na vitrine de Goiânia, representava um meio de chegar um pouquinho mais próximo desse sonho, de ser “pelo menos” igual a ele.
Não sei como minha mãe fez aquela compra. Com certeza dividiu em mil prestações, e passou apuro para pagar, mas eu saí de lá com aquele violão imenso debaixo do braço.
No entanto, apesar de toda essa dificuldade na escola e do colete de gesso que limitava os meus movimentos e me obrigava a usar roupas muito maiores que o meu número, me deixando com uma aparência pra lá de estranha, eu me inscrevi no Festival de Férias da Música Popular de Ituiutaba, com o Grupo ASAS, que eu, Celsinho, Nikula e Deise criamos para o evento.
Foi um festival lindo, com muita gente boa. Aquelas melodias e letras ainda povoam minhas melhores memórias até hoje. Eu já estava feliz por me apresentar, e de certa forma dar uma volta por cima em tudo aquilo de “ruim” e de diferente que estava me acontecendo naquele ano. Já estaria feliz se tivesse ficado entre os classificados, mas fomos os vencedores, com a música Retratos. Lembro-me do pulo imenso que dei quando saiu o resultado, com gesso e tudo, e minha coluna ainda em recuperação. Foi o coroamento de um momento que significou muito em minha vida, e também para aquela amizade.
